
Existe uma espécie de cepticismo anterior a todo o estudo da filosofia, fortemente recomendado por Descartes e outros como uma protecção eficaz contra os erros e os juízos precipitados. Este cepticismo recomenda uma dúvida universal, não só quanto às nossas opiniões e princípios prévios, como também quanto às nossas próprias faculdades; faculdades essas de cuja veracidade, dizem, nos devemos assegurar por meio de uma cadeia de raciocínios deduzida de um princípio original que não possa de modo algum ser falacioso ou enganador. Mas por um lado não há um tal princípio original, dotado de uma qualquer prerrogativa sobre outros que são auto-evidentes e convincentes, e por outro, se ele existisse não poderíamos avançar um passo que fosse além dele, a não ser usando aquelas mesmas faculdades das quais já se supõe que desconfiamos.
Logo, a dúvida cartesiana, ainda que qualquer criatura a pudesse atingir (coisa que claramente não pode), seria totalmente incurável e nenhum raciocínio poderia alguma vez conduzir-nos a um estado de certeza e convicção sobre o que quer que fosse.
Contudo, tem de se confessar que esse tipo de cepticismo, quando mais moderado, pode ser entendido num sentido muito razoável e constitui uma preparação necessária para o estudo da filosofia, preservando uma adequada imparcialidade nos nossos juízos e libertando o espírito de todos os preconceitos que nos possam ter sido incutidos pela educação ou por opiniões precipitadas. Partir de princípios claros e auto-evidentes, avançar com passos seguros e cautelosos, rever frequentemente as nossas conclusões , examinando cuidadosamente todas as consequências; embora tais meios tornem o progresso dos nossos sistemas mais lento e limitado, são os únicos métodos que nos permitem esperar algum dia alcançar a verdade, chegando a uma adequada estabilidade e certeza nas nossas definições.
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