
Não preciso de insistir nos argumentos mais triviais utilizados pelos cépticos de todas as épocas contra os dados dos sentidos. Como os que se reportam às falhas e imperfeições dos nossos órgãos em inúmeras ocasiões, à aparência distorcida de um remo na água, às diferentes perspectivas dos objectos conforme as suas distâncias, às imagens duplas produzidas ao pressionarmos os olhos e a muitos outros fenómenos da mesma natureza. Na verdade, esses argumentos cépticos são apenas suficientes para provar que os sentidos, só por si, não são algo em que se possa confiar implicitamente, mas que o seu testemunho tem de ser corrigido pela razão e por considerações relacionadas com a natureza do meio, da distância do objecto e da disposição do órgão, para que se tornem, no seu âmbito próprio, critérios adequados de verdade e falsidade. Há outros argumentos mais profundos contra os sentidos, que não admitem uma solução tão fácil.
Parece evidente que as pessoas são levadas por um instinto ou predisposição natural a depositar fé nos seus sentidos e que, sem qualquer raciocínio supomos sempre um universo exterior que não depende da nossa percepção, e que existiria mesmo que nós e todas as outras criaturas sensíveis não existíssemos ou fôssemos aniquilados. Mesmo o reino animal se rege por uma opinião semelhante e conserva essa crença nos objectos exteriores em todos os seus pensamentos, desígnios e acções.
Também parece evidente que, quando as pessoas seguem este cego e poderosos instinto da natureza, tomam sempre as próprias imagens representadas pelos sentidos como sendo os próprios objectos externos, jamais suspeitando que as primeiras não passam de representações dos segundos.
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